quarta-feira, 12 de maio de 2010

O problema dos juízes

Alguns jovens parecem conseguir abarcar todo o saber numa área de conhecimento. Não se percebe como o conseguem. No entanto, tornam-se lúcidos ou translúcidos perante a escola. Absorvem e sintetizam. Na universidade, aprendi com eles mais do que com os professores. Alumiaram as minhas dúvidas e segui as parcas palavras que captei. Se o leitor não se apercebeu de nenhum, saiba que são raros. Atirados para o mundo burocrático, perdem-se nas agruras armadilhadas que servem os velhos e os oportunistas. São ainda mais raros os que singram ou que se tornam conhecidos.


Um princípio de mérito aconselharia que lhes fosse aberta a porta dos lugares mais distintos da sociedade. Todavia, a experiência mostra que nem sempre se cumpre uma cabal realização do seu génio. Ora, numa sociedade livre e aberta, deve acreditar-se que os melhores conseguem sustentar-se por si bastantemente.

Perante tal dilema, parece que não se deve exigir dos jovens uma responsabilidade comparável à dos velhos. A carreira é um contra-senso do mérito e a burocracia é uma convulsão do génio.

Por outro lado, não se conhece processo de selecção algum que evite que os oportunistas tomem o lugar dos seres geniais. Precisamente, a selecção tem de ser feita por quem é meramente banal, sério, velho (pensemos na incompetência fundamental do júri do concurso das pontes suspensas).

Concluindo: os lugares de destaque devem ser assumidos pelos mais velhos, quando dependem de uma carreira, isto é, de um caminho submetido a escrutínio. Não deve haver juízes jovens.


O escrutínio é duplo ou triplo: de satisfação do direito, de satisfação jurisprudencial e de satisfação socio-económica. Batalha-se pelo ganho de causa e dessa batalha faz-se o direito e, quantas vezes, a lei. Ora, quem batalha não pode escrutinar os juízes. Não pode morder a cauda. E as influências que muitos trazem para a batalha não podem chegar à independência dos decisores. Os advogados e os políticos têm de ficar de fora dos sistemas de controlo de qualidade das decisões dos juízes. O melhor argumento que pode colher-se no exterior neste mesmo sentido é a cavalgação que os advogados da Ordem dos Advogados e da Assembleia da República têm vindo a fazer para sindicar e controlar os juízes.

Por último, o trabalho do juiz é o pensamento, uma busca quase sempre inconsequente da razão. A decisão do juiz, por ser necessariamente conjuntural, tende a estar errada. Daí a evolução da jurisprudência (examine-se a que foi proferida a propósito do Código da Estrada desde os anos 40 e perceber-se-á quão serôdios foram os de ontem aos olhos de hoje, e os de hoje serão para os de amanhã). Tal exercício de intelectualidade não se compadece com prolixismos produtivistas ou com horários laborais. Um juiz não trabalha, elabora, raciocina, historicisa-se.

Assim, propomos que, em vista de uma sociedade justa, não se faça carreira da judicatura, que os juízes sejam escolhidos de entre os mais velhos, que não sejam sindicados pelos advogados ou pelos políticos e que não estejam submetidos a horário de trabalho, nem a critérios de produtividade estrita.

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