quarta-feira, 21 de julho de 2010

Sida: o Gel da Serpente

Há coisas muito actuais que fazem lembrar o Ovo da Serpente, o polémico filme de Ingmar Bergman.

A primeira é a estonteante facilidade com que a comunicação social dá eco, ad nauseam, de qualquer notícia que emane de fonte de autoridade sob matéria de interesse relevante. Propagação acéfala, acrítica, imponderada, muitas vezes mera reprodução dos comunicados de imprensa de organismos politicamente activos. Em tais casos, cabe perguntar para que serve a imprensa. E percebe-se que serve para corroborar, directa ou indirectamente, o efeito que alguma entidade pretende produzir, levando ao convencimento do público, tanto através da credibilidade de que ainda desfruta entre os incautos, como talvez mais ainda pelo cansaço da repetição inútil.

Fazendo tábua rasa dos ridículos géis de outrora (espermicidas e bactericidas), surge agora um estudo que anuncia um gel que permite a 54% das mulheres que o usam rigorosamente duas vezes por dia evitar o contágio de HIV em relações com o parceiro habitual.  Se o usarem mais de 30 meses seguidos, o gel perde a eficácia. Se o usarem apenas em 80% das relações a percentagem baixa para 29%. A experiência fez-se na África do Sul com um  grupo de 450 mulheres casadas cujos maridos se recusam a usar preservativo. Aquele grupo foi comparado com outro de iguais características a que foi ministrado um gel sem efeitos medicinais, mero placebo, e que desconhecia este facto. Neste segundo grupo, a incidência de sida foi de 60 casos, face a 38 casos no grupo com gel anti-viral.

À vista desarmada, parece que 60 para 450, não difere muito de 38 para 450, quando se está perante uma doença mortal: uma relação de 13% para 8%. A diferença pode dever-se simplesmente à maior ou menor promiscuidade dos homens ou ao maior risco assumido por alguns deles, sendo de todo impossível avaliar comportamentos privados em pessoas não sujeitas à experiência (que visou apenas as mulheres).
Mas é chocante admitir que tantas mulheres estiveram enganadas com um placebo, durante tanto tempo, quando bastaria controlar e identificar o grupo para garantir idêntica estatística. É muito chocante constar que 60 mulheres contraíram a doença, crendo que o gel as poderia proteger! É uma experiência macabra, violenta, manipuladora, que despreza o bem precioso da vida. Um sacrifício que ombreia com o médico nazi do Ovo da Serpente.

É ultrajante que o combate à doença não enfrente os preconceitos discriminatórios vigentes em muitas comunidades africanas, e procure adaptar a medicina e a saúde a comportamentos de exploração do trânsito sexual, a menosprezo da dignidade das mulheres, perante o marido relapso e inconsequente. Sabe-se que a incidência da sida é directamente proporcional à falta de liberdade e de auto-determinação sexual, quantas vezes acompanhada de situações de pobreza grave, opressão e violência. Uma sociedade assim não é machista, é paranóide e auto-destrutiva. Um Estado que contemporiza com tais desmandos, que não enceta campanhas, hoje tão banais, de informação e divulgação, de distribuição de preservativos e de perseguição dos contaminadores intencionais é um Estado que tem um óbvio interesse na degradação da sua própria população, que vive do flagelo e encontra nos seus efeitos forças para se impor e quebrar resistências. A África do Sul é um estendal infindável de Apartheids, a que é preciso pôr cobro.

Não. Efectivamente pretende-se atingir um objectivo ainda por esclarecer. Se se somarem as notícias de que, crendo que reduz o risco de contágio de HIV, Bill Gates financia a circuncisão em África, tendo sido já realizadas cerca de 60.000 intervenções, e se se investigarem os boatos de que se propõe desenvolver vacinas que reduzam a fertilidade humana, com o propósito de reduzir a população mundial, temos de achar, sem medo de conspirações, que algo de não revelado se vai fazendo, com o apoio dos governos mundiais. Note-se aliás que África nem sequer é um continente com problemas de sobrepopulação e que tem riquezas naturais imensas sub-exploradas.

Para já, seria tão bom que conseguissemos voltar a ter imprensa!

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