Cresce o pressentimento de que a reconstrução urbana das cidades aguarda os efeitos de um próximo grande sismo. A geologia, mal amada pela política e pelos éticos, tem estado, desde as suas origens oitocentistas, relegada para um domínio de oclusão e de sombra. As descobertas que produz tornam-se públicas com décadas de atraso, mas não são desconhecidas da alta esfera dos decisores. Foi assim com a teoria da deslocação das placas continentais, que esteve proibida durante quarenta anos. É hoje assim com as tecnologias que detectam o risco sísmico, também falsamente escamoteadas. Não se fazem ensaios geológicos sérios e profundos, apesar de disponíveis, mas sabe-se que poderá estar próxima a eventualidade de um tremor de terra de escala destruidora. Turquia, Itália, provavelmente Portugal. É neste quadro que alguns técnicos ligados ao aparelho político gracejam perante a urgente necessidade de recuperar os centros urbanos e alguns subúrbios das nossas maiores povoações, que apresentam um calamitoso estado de conservação. É ainda naquele contexto que os bombeiros e a polícia fazem exercícios absolutamente ridículos, denominados de protecção civil.
Uma nova ordem política poderá ser lançada em caso de efeitos sísmicos catastróficos. Não temos a pujança dos grandes países, que encontram em si próprios os recursos para fazer frente às calamidades. Nota-se aliás uma política consistente, persistente e conjugada de construção de edifícios públicos seguros ao redor dos maiores núcleos urbanos. Pavilhões desportivos e escolas para realojamento da população afectada, teatros para quartel-general das forças de intervenção, hospitais com capacidade de salvamento, universidades para realojamento das classes superiores, redes circulares de estradas que ligam aqueles equipamentos, etc. O estado prepara-se para resistir aos efeitos de um eventual terramoto.
Entretanto, a maioria da população vive em edifícios incapazes de resistir a um sismo superior a 6 graus na escala de Ritcher. Não se espere que seja possível a responsabilização dos construtores: os eventuais crimes estarão prescritos e os que não o estiverem não terão responsáveis com meios para suportar as indemnizações. Assim o permite a actual lei. Todavia, essencial seria que se tomassem medidas para salvaguardar as populações. E são essas medidas que faltam, estranhamente. Na actual crise, uma política de verificação e correcção de defeitos poderia contribuir para melhorar a actividade de algumas empresas e manter empregos.
Em vez de se perder tanto tempo a discutir a conjuntura, interroguemo-nos sobre um cenário de ruptura que deite por terra não só as casas, como o regime democrático.
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